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Terça-feira, 25 de Marco de 2025
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Uma corrida de gato e rato

A magia do celular vai além das ligações tradicionais.

Uma corrida de gato e rato
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Lembro como se fosse hoje: meu aniversário de 15 anos. Seguindo a tradição brasileira, esse é considerado um evento importante para grande parte das meninas. Foi nesse auge da minha introdução de debutante à sociedade quando eu o ganhei. Ele tinha cerca de 10 centímetros, com um pequeno visor, teclado de plástico macio ao toque e com uma capinha roxa brilhante: meu primeiro celular! Era o apogeu da liberdade na minha adolescência na mudança do milênio.

Faço parte de uma das últimas gerações que viveu a incrível transição entre um mundo 100% analógico no dia a dia para um outro universo 100% digital. A internet não perdoa a nossa geração e usa com peculiar humor nossa jornada de millennials. Derivada do latim, o termo "millennium" é formado pelas palavras "mille" (mil) e "annus" (ano). Não! Não temos mil anos… mas o que vivenciamos nos últimos 30 a 40 anos equivale a uma experiência evolutiva, do ponto de vista tecnológico, de mais de 200 anos.

 Atualmente, como mãe de duas filhas, uma delas já no seu próprio período de “début”, vejo como esse aparelho revolucionou nossa vida como um todo. E, com o mesmo bom humor das espinhadelas dos vídeos de redes sociais, proponho uma reflexão sobre o tema. Você: mãe, pai, responsável por adolescentes, saiba que não estou aqui como dona da verdade, mas como alguém que muitas vezes erra na educação dos filhos (quem nunca?) e que, justamente, por isso, é capaz de rever decisões e fazer análises. Minha filha mais velha ganhou o primeiro celular aos 10 anos, já com acesso à internet, ainda que limitado pelos controles parentais… A caçula, aos 8, bradava por justiça querendo se igualar à irmã, em posse do aparelho mágico.

A magia do celular vai além das ligações tradicionais. Perguntei à minha sobrinha de dois anos que brincava com uma capinha como se fosse o aparelho de verdade:  “pra que serve o celular?”. Os olhos se desviaram do telefone imaginário e me fitaram desacreditados com o questionamento. Suas mãozinhas pequenas seguraram o plástico translúcido na horizontal e sua voz fina sentenciou: “pra ver filme!”. A convicção na sua voz era impressionante. Como eu poderia duvidar de algo tão óbvio?

“Mas o óbvio só é óbvio para olhos treinados”. Essa frase eu guardo de um grande mestre com quem tive o prazer de fazer meus primeiros estudos de pós-graduação. E sabe o que não é óbvio para muitas famílias hoje em dia? Como é necessário colocar limites ao uso do aparelho. Há mais de uma década, países com tecnologia de ponta, como a Coreia do Sul, já tinham inaugurado acampamentos para desintoxicação tecnológica. Sim… um lugar para aprender a viver sem a dependência do celular. O público-alvo? Os jovens. Da Austrália, em 2007, veio o neologismo “phubbing”, que só se popularizou em 2012, quando campanhas para que as pessoas parassem de se ignorar com o celular ganharam força.

A tecnologia voa quase à velocidade da luz e continuamos sem saber ao certo como limitar o celular sem deixar de sentir que perdemos um pedaço de nós mesmos. Agora, a palavra do ano novamente se remete aos perigos vinculados ao aparelho: brain rot. O termo sintetiza a deterioração do bem-estar mental e cognitivo, por excesso de consumo de informações banais em redes sociais. No entanto, esse é um tópico que merece outras muitas linhas. O que fica em evidência com a trajetória do celular somado à internet é a necessidade de enxergar os excessos e de controlá-los, para que não percamos o que nos torna mais humanos: conectividade e empatia.

Neste prisma, a escola se vê em uma corrida de gato e rato. Já houve tempo em que a tecnologia era o palco (e o mecanismo propulsor de marketing) para que as aulas acontecessem: notebook, tablets, celulares, lousas digitais, tudo o que não aposenta o vínculo do professor e o aluno, muito menos substitui a importância da escrita em um bom e velho papel. Ativamos áreas diferentes do cérebro quando escrevemos e não apenas digitamos. Mas, em pleno século XXI, as mãos dos adolescentes doem por falta de prática e a letra é outras tantas vezes um desafio para quem a compõe e para quem a lê. Atividade motoras da primeira infância precisam ser fortalecidas para o desenvolvimento da escrita. E esta, por sua vez, deve ser praticada como forma idiossincrática da nossa formação psicossocial.

Com tantas questões em jogo, o ano letivo começa com o Projeto de Lei n° 4932, de 2024, o qual proíbe aparelhos eletrônicos nas escolas públicas e privadas em todo o país. A finalidade é simples, porém desafiadora: proteger a saúde mental, física e psíquica dos menores. A polêmica foi instaurada. Em colégios cujas aulas já se iniciaram, é possível recolher relatos de alunos e de pais sobre a proibição. Há quem se questione como farão acontecer situações “básicas” de antes, como pedir um ifood, um uber, trocar mensagens nos intervalos… enquanto outros pais suspiram aliviados quando a coordenação, por orientação legal, recolhe o aparelho e solicita que o responsável pelo aluno o venha retirar pessoalmente.

 Todo processo de mudança vai gerar incômodo. No entanto, sigo acreditando que a retirada dos aparelhos eletrônicos dos alunos no ambiente escolar é positiva e não descarto os embates iniciais que se farão presentes para muitos. Sim, será imprescindível repensar a rotina e isso nos presenteia com uma grande oportunidade de viver o hoje fora do automático: desde o planejamento alimentar do aluno que fica fora o dia todo, quanto o teor das mensagens “urgentes” ao longo das horas… Quando tudo é urgente, então nada de fato o é. Os intervalos nos pátios também serão repaginados com jogos, rodas de conversa e leitura. Não será do dia para a noite. Mas é um processo do qual nós, os pais e equipe escolar, devemos nos apropriar para que sejamos o suporte dos nossos filhos e alunos.

Como no conto de La Fontaine, sabemos que devemos colocar o guizo no pescoço do gato. E vamos, ao longo deste ano, descobrindo meios para fazê-lo, para que - assim - a corrida de gato e rato se limite aos divertidos episódios de Tom & Jerry!

Quer saber como cuidar da rotina escolar do seu filho e ajudá-lo nessa transição? Venha conhecer a equipe do Fontes Educacionais e o trabalho de mentoria da Madame Linguagem.

 

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